domingo, 22 de dezembro de 2013

Espanha (Spain) - Palma de Mallorca (PARTE II)

                                                        A cidade dos Deck-Hands

O Google me ajudou. Ahh sim, deck-hand é marujo e Palma a cidade dos navegantes.

 E não deu outra, conheci e convivi com uma classe que eu nem sabia que era tão cheia de características próprias: a dos marujos (mas não como os pescadores da Baía de Guanabara não, caso vocês estejam imaginando). Falo da high-society navegante. Falo dos maiores iates e não de barquinhos ou jangadas como os de Pipa.


Conforme fui conhecendo Palma e a correria do Tom entendi mais uma razão para ele ter ido parar lá: o Luxo.
A cidade não tinha um cantinho sujo e com mendigos, não, não... nada disso!
Me surpreendi porque esperava encontrar uma Espanha em crise. Mas a crise parecia não ter chegado nessa ilha. Tudo era rico. A fachada dos restaurantes, as pessoas na rua, os carros, o bar na esquina que eu nem sei se ofendo ao chamar de bar.

Me lembrou algo como um Búzios milionário ou bilionário, se pá. Búzios multiplicado por euros.

Até a parte “central e antiga” onde ficava o meu hostel era rica. Era como uma Lapa com um investimento de alguns muitos milhões. Onde ficava meu hostel tinha o charme das varandas de ferro, pé direitos altos, um pedacinho ou outro de parede descascadas, mas que para mim só deixaram para agradar os turistas que iam para palma para fugir da “rotina de luxo”. Clima praiano, sabe como é né?

Para mim não passava de aparência porque nada deixava de ser luxuoso. Mas mais uma vez quem sou eu para julgar, né? Estudo na UFRRJ e por isso moro atualmente em Seropédica, onde ter ar-condicionado é luxo.


Mas cada vez mais percebi que não passava mesmo de aparência. Porque apesar de tudo isso eu comia bem duas vezes ao dia com 10 euros e comprava um litro de cerveja gelada com 1 euro. Fiquei em um hostel no melhor lugar da cidade, no centro da bohemia noturna e a um quarteirão da praia e da catedral com internet, bar e quarto individual por 25 euros a diária. Na Palma de Mallorca sem crise isso nunca aconteceria.

Palma vivia em um mundo da imaginação a parte do resto da Espanha que eu não entendia. Mas e eu com isso¿ Eu aproveitava e só torço para continuar dando certo(apesar de ter as minhas dúvidas), porque quero que muitos conheçam aquela cidade linda, a minha Bonequinha de Luxo.


Bonequinha de Luxo e sorridente, aliás!

Como os espanhóis foram simpáticos e prestativos comigo! O dono da cafeteria da esquina do meu hostel da onde eu usava o computador era como um avô. Perguntava todo dia como eu estava, puxava papo, e mesmo sem eu nunca ter comido lá me chamava de algum apelido carinhoso que eu tento de qualquer jeito lembrar mais não consigo. Que pena!
O dono do meu hostel era outra jóia. Esse era como um pai. Me dava todo dia dicas de onde ir, o que fazer e, principalmente,  aonde não ir, os cuidados para eu tomar e o que não fazer. Quando o Tom foi me encontrar perguntou quem ele era, se eu já o conhecia e se era de confiança.

O moço da banca sorria, o taxista contava piada em espanhol que só eu entendia. O menino bonito atravessava a rua com um mega sorriso para me ajudar me vendo perdida com um mapa na mão. Não sei se era o sol ou o mar azul cristalino, mas aquela gente era feliz!


Caprichos e leis para inglês ver a parte, que cidade linda!

Minha boca abria a cada esquina que eu virava. Era uma mistura de 5th Avenue  com Lapa muito linda e colorida!


Mar azul azul de doer a vista, a catedral dando um show em frente ao mar e por trás dela havia todo um bairro clássico que eu ia todo dia passear pelas ruelas alguma hora do dia.






Sempre tinha algum evento.



             Nos meus dias lá peguei feiras de artes e produtos artesanais onde os mais variados artistas vendiam milhões de pinturas, ou qualquer outro tipo de arte. Apresentações de dança pelas muralhas do que para mim era um castelo, festival de cerveja com porções de comida por dois euros. E a senhora tocando arpa?! Me hipnotizou e depois de meia-hora parada sentada no muro escutando o som da arpa fui surpreendida pelo Danti, um Italiano de Roma que se ajoelhou na minha frente com uma flor na mão me oferecendo e com quem tive uma bela tarde passeando e conversando sem nem conseguirmos concluir uma frase pois ele só falava italiano e aí já era impossível para mim acompanhar. Mas a gente se virava com gestos e mímicas e foi uma bela tarde. E agora tenho uma casa em Roma quando decidir passear por lá! (Ou pelo menos foi o que eu consegui entender).

O Tom trabalhava durante o dia e às vezes a noite sempre nos barcos e iates. Alguns até que ele mesmo tinha projetado anos atrás em Auckland e que tinham ido parar em Palma. Vivia no mar onde o celular não pegava. E no dia que eu cheguei ele estava se mudando para o Iate de um jogador de Rugby famoso da Nova Zelândia que ele encontrou dias antes da minha chegada na Europa em um bar. Conversa vai e vem, ele comentou que era engenheiro naval e bam! O cara ofereceu um trabalho para ele por sei lá quantos meses a bordo do Iate que iria partir para o sul da França em alguns dias. Ele não sabia ao certo que dia partiria. Provavelmente em três dias desde a minha chegada em Palma, mas talvez antes se ele fosse solicitado. E a proposta era irrecusável.
“Vai fundo, Tom” foi sem dúvidas a primeira coisa que eu falei.

  O Iate era cinco vezes o meu apartamento e quando eu entrei fiquei até com medo de encostar em qualquer coisa e quebrar. Eu mal queria sentar na proa(onde haviam dois Jet-skis). Tudo era caro demais!

Fui percebendo que não era mesmo a toa que ele tinha ido parar lá depois da América do Sul. Palma era muito famosa por esse estilo de vida. Famosa no mundo todo. E me senti até meio burra porque eu era a única pessoa naquela ilha que não fazia idéia disso.

Todos que ele me apresentou entendiam de barcos, conversaram sobre barcos, trabalhavam embarcados. Estavam com a gente em um dia fazendo planos para o final de semana seguinte e no dia seguinte, bam! Tinham ido embora embarcados sem idéia de quando iriam voltar. Todo dia era a despedida de alguém. E também a chegada de alguém.
Assim era a vida dos engenheiros navais e dos deck-hands( ou marujos) em Palma. Tinham que estar sempre alertas, coisas práticas para empacotar e partir, pois nunca se sabia quando embarcariam.  Sem apegos. Simplesmente iam e voltavam sei lá quanto tempo depois trazendo as mais diferentes histórias. Bem igualzinho àquela música da Adriana Calcanhoto “ahh se eu fosse marinheiro...”, sabe¿ Não existe melhor descrição das pessoas que conheci. Por isso havia cartazes de deck-hands disponíveis por toda a cidade, porque sempre se precisava de um.

Agora sim eu entendia a correria. Agora tudo fazia sentido. Nossos rumos que um dia foram os mesmos pelas ondas do Perú estavam agora opostos.

Mais uma vez uma imagem diferente do ano passado, que os cabelos eram curtos e tudo era certinho e calculado.


 Dessa vez os cabelos eram compridos e largados, menos tímido, menos pragmático e bem menos organizado.



Tudo estava mudado. Eu não me encaixava naquele estilo de vida nem um pouco. Não tinha absolutamente nada contra, apenas não era para mim.

Era um estilo de vida intenso. Como eles nunca sabiam quanto tempo estariam lá reunidos, as noitadas eram as mais loucas, com a maior quantidade de bebida possível e iam até o sol nascer. Sempre. Nunca queriam se estressar com nada, pois não dava tempo de estressar e desestressar e às vezes exageravam na dose tanto da bebida quanto do individualismo. Não conheciam nada da cidade além do mar e das praias. Não dava tempo de fazer turismo, preferiam se encontrar em um pub e colocar o papo em dia enquanto ainda desse tempo, antes que alguém fosse embora.



          No meu primeiro dia o Tom me buscou para me “mostrar a cidade”.

“Leve biquíni!” ele disse e eu adorei a idéia. Pensei que iríamos para a praia. Mas não. Andamos um pouco pela parte clássica em volta do meu hostel e pronto, ele me colocou em um táxi dizendo que ia me levar em um lugar muuuito legal que ele ia quase todo dia. Fiquei empolgada! Legal! Mas quando chegamos era um pub na cobertura de um prédio com piscina que só a high society conhecia e frequentava e onde o único espanhol local era o moço que fazia os drinks. E era para isso o biquíni. Acabou que nem entrei na piscina, nem deu vontade. Afinal, tinha um marzão azul me esperando lá na praia, né?



Ok, legal... mas e a cidade?! Eu perguntei sobre a Espanha, sobre a cidade, a história da Catedral, perguntei o que eram algumas construções no caminho e ele não sabia me dizer nada. Onde encontrar os melhores Tapas, o melhor flamejante, o melhor iate, o bar que passa os jogos de Rugby ele sabia me dizer direitinho. Ele estava lá há uns bons seis meses e parecia que nunca tinha pisado na Espanha. Mal balbuciava qualquer coisa em espanhol e achava que era mais do que o suficiente. Porque para o que ele precisava(ir de um lugar a outro no táxi ou comprar uma cerveja) era suficiente. Não só ele como todos os marujos que ele me apresentou da Austrália, África do Sul, Inglaterra, França. Ninguém sabia nada daquele lugar.

“Que desperdício!  Olha essa cidade maravilhosa e colorida, olha essas pessoas simpáticas, olha essa cultura!”


Eles não perguntavam sobre o Brasil. O pouco que falaram  foi falando que viriam para  Copa do Mundo, futebol, e macacos na rua, etc. Essas coisas clássicas. Mas dessa vez não senti vontade de falar sobre o Brasil, eles não estavam abertos a escutar. Conversávamos sobre outras coisas.

Eles iam e vinham nos barcos e pareciam nunca ter tido tempo de prestar atenção.

Depois do bar ele fez uns telefonemas e só virou para mim e disse “tenho uma surpresa para você e você vai amar!” Descemos do pub e um carrão parou.  Entramos e fomos sei lá para onde! Eu só aproveitava para continuar meu “passeio turístico” que ainda estava incompleto olhando pela janela tudo como um cachorrinho mesmo. Mas o carro ia rápido demais! Saímos do centro da cidade e fomos parar em um resort na beira de uma praia. Eu continuava sem entender esse cronograma de passeios turísticos bem peculiar, mas, bem, não tinha muita opção senão me deixar levar.

Quando entramos vi onde ele tinha me levado: para surfar.


Meu sorriso ficou gigante olhando aquelas ondas, mesmo que artificiais! E eu olhei para ele e entendi que não era porque tínhamos mudado que não podíamos nos dar bem e mantermos aquilo que temos de bom em comum. 



                                   O que vale realmente é a intenção e ele me fez ver isso.

O cronograma dele seguiu assim.
Para irmos à praia simplesmente para fazer nada e dar um mergulho era um trabalho árduo de convencimento. Ele ia, mas sempre de ressaca e já ouvindo um eletrônico. E sempre tínhamos que correr porque logo começaria uma festa que não podíamos perder. Ou melhor, que ele não podia perder. Porque eu não estava nem aí para festas e nem queria gastar dinheiro com isso. Me irritei às vezes no início, mas realmente só ia me dar dois trabalhos: me irritar, e me desirritar (arram, acabei de inventar) e não dava tempo. Eu estava lá naquela cidade linda, tinha largado Elena que passou semanas organizando nosso cronograma para estar lá, e eu não podia ser burra de perder tempo triste ou irritada.



Nos quesitos “turismo pela cidade” e “conhecer a cultura” eu vi que ia ter que me virar sozinha. Fiz amizade com uma Sul-Africana do meu hostel e passeávamos juntas.
Eu pegava ônibus, seguia mapa, saía pedia informação e fui me virando.

Quando ela não estava, eu ia sozinha. 
Conversava com o moço que vendia buginganga, com a moça que alugava bicicleta, e assim ia me divertindo. Fiquei feliz de estar em um lugar que falavam espanhol e onde eu não precisava depender de tradutores improvisados. 


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